GRUPOS QUE LUTAM PELA MELHORIA DE QUALIDADE NA
EDUCAÇÃO PÚBLICA
Entrevista
por Juraci Reis – graduanda em Pedagogia pela
UNIRIO
José Reis fala sobre a
participação dos pais no contexto escolar ao implementarem oficinas de informática
nas escolas
osé Francisco dos Reis Neto é Analista
Contábil, aposentado, pai comprometido com a educação. Em 1996 José Reis junto
com um grupo de pessoas implantou oficinas de informática em várias escolas da
cidade de Mendes. Os laboratórios aconteceram dentro do Projeto Oficina de
Informática na Escola (Projeto OIE) da Associação de Pais e Amigos das Escolas Públicas
de Mendes (APAAEP-Mendes), com a participação, principalmente de pais e colaboração
de alguns diretores e professores.
José Reis já proferiu várias palestras e respondeu a muitas perguntas
sobre o relacionamento entre pais e escola, o papel dos professores e o das
escolas nessa relação.
Em entrevista exclusiva para a
disciplina informática na educação, 3º período de Pedagogia da UNIRIO, Reis então, fala sobre a trajetória pioneira
no Estado Rio de Janeiro, desse grupo independente e organizado, de pais de
alunos das escolas públicas.
A caminhada impetrada pela APAAEP
em um projeto inovador traz esperanças a quem deseja ver a tecnologia a favor
da educação com a participação comunitária. Maiores informações, leia a
entrevista completa.
Juraci -. O Sr. acha que os pais tem autonomia para
formular conceitos e ideias que proporcione melhoria da educação?
JR – Não só melhoria de
qualidade no ambiente escolar, mas também o exercício efetivo do pensamento democrático
participativo, possibilitando uma Educação promotora de mudanças na vida
comunitária, com aperfeiçoamento das relações humanas, proporcionando o bem
estar social e a redução da desigualdade na medida em que se consolida a prática
da justiça social.
Juraci - Como pai de aluno, com certeza o Sr. viu inúmeras
situações que o inclinou a reunir um grupo que lutasse pela melhoria da escola
pública. O que na verdade o inspirou a criação da Associação?
JR – No
ano de 1995, a Coordenadoria Regional de Ensino Centro-Sul,do Estado do Rio de
Janeiro, apresentou uma proposta para utilização das instalações físicas do
Centro Integrado de Ensino Público nº 288 (CIEP) para o ensino médio, acabando
com o atendimento ao Ensino Fundamental(1ª a 4ª série) em tempo integral.
Mediante o fato, que traria prejuízos para as famílias beneficiadas com o
horário integral, um grupo de pais e alguns professores da rede Estadual de
ensino em Mendes, elaboraram um manifesto intitulado "UMA PROPOSTA DE QUALIDADE
PARA O CIEP 288", com proposta alternativa para atendimento ao Curso de
Formação de Magistério e continuidade do atendimento às crianças. Nesta oportunidade percebemos a necessidade da organização para que, de forma coletiva, pudéssemos ter vez e
voz para compartilhar nossos ideais e materializar os sonhos de uma Educação
Pública de alta qualidade com a participação dos variados segmentos da
sociedade. Encontramos muitas dificuldades.
Juraci - Por que os pais tiveram tanta dificuldade
de participação?
JR -
Tradicionalmente, as Unidades Escolares
sempre tiveram uma atitude segregadora em relação à presença da comunidade no
ambiente escolar. A relação com a Família sempre obedeceu a regras determinadas
pela Escola, que condiciona participação
dos pais e ou responsáveis ao calendário elaborado de reuniões ordinárias periódicas
(informações sobre notas e comportamento de alunos) e festas comemorativas, ou necessidade de reparos em móveis,
utensílios ou equipamentos(mão de obra gratuita). Desta forma, criou-se um costume vicioso de
manter-se distante do ambiente escolar os familiares dos alunos, no preconceito
de que a presença dos mesmos atrapalharia a funcionalidade do sistema. Como
consequência, os pais, em sua grande maioria, incorporaram essa ideia separatista
e acomodaram-se em suas posições de não participantes da vida e dos destinos da
Escola.
Juraci – O que
despertou na APAAEP o interesse em instituir as oficinas de informática nas
escolas em um tempo em que nenhuma escola possuía?
JR- O encanto pelas propostas de educadores brilhantes como Anísio Teixeira,
Paulo Freire, Darcy Ribeiro, bem como a dinâmica de Gestores e professores que ousavam quebrar o paradigma da não
participação comunitária, promovendo ações integradoras de sucesso nos
ambientes escolares. Este incentivo, aliado a necessidade de se criar estímulos
para uma aprendizagem mais interativa,
alcançando os objetivos propostos de educar a todos e também demonstrar que
nós, pais, somos capazes de criar e administrar condições positivas a um ensino
de qualidade, que transforme para melhor a vida em sociedade.
Juraci – E então encontraram
dificuldades nessa tarefa?
JR - Algumas dificuldades, principalmente pelo pensamento reacionário de
professores e dirigentes, contrários a nossa presença na Escola e de
administradores políticos que visualizavam nossa participação como subversão a
ordem constituída, colocando em risco seus projetos pessoais.
Juraci - Como foi planejado o
projeto?
JR - A essência do projeto
foi de conquistar a confiança de empresários e possíveis doadores como pessoa
física, para perceberem a capacidade empreendedora do grupo, com a certeza
de que não haveria influência político-partidária
e a transparência das ações, possibilitando visualizar os resultados
obtidos.
Juraci - Com que objetivo?
JR- Com o ideal de utilizar a tecnologia como apoio no processo
ensino-aprendizagem, no Ensino de Pré-Escolar e Ensino Fundamental, com equipamentos
e programas educativos, objetivando redimensionar os valores humanos, incentivando
as habilidades do pensamento e tornando a relação entre professor(a) e alunos
mais participativa e motivadora.
Juraci - Qual o público
alvo do projeto?
JR
- O
projeto "OIE" pretendeu alcançar clientela em três segmentos:
1º. Atuar com crianças, motivando-as a permanecerem no ambiente escolar, com
métodos que busquem resgatar o sentimento de autoestima, que em muitos casos
encontram-se em declínio. Proporcionar também aos alunos dos Núcleos de
Educação Especial, ou em processo de Inclusão, condições tecnológicas no
ensino, que possam reduzir ou eliminar as dificuldades de acesso ao aprendizado.
2º. Atender também aos alunos no ensino de Jovens e Adultos, no horário
noturno, é um dos pontos planejados como apoio ao aprendizado dos que se
enquadram no perfil de defasagem idade/série.
3º. A participação de segmentos da Comunidade, em cursos básicos, também está
previsto.
Juraci - Houve insucesso nesta caminhada?
JR - O primeiro computador
utilizado para fins pedagógicos na cidade, foi instalado pela APAAEP em abril
de 1996, no CIEP 288( modelo 586, tecnologia de ponta na época), através
campanha de doações da comunidade. Os professores recusaram-se a formular planejamentos
e trabalhar com os programas educativos instalados. Alguns meses depois, o
equipamento foi retirado de sala e colocado na Secretaria para trabalhos
burocráticos e escolares dos professores. Nosso grupo foi forçado a retirar-se
da Escola, onde fazia reuniões mensais para discussão de estratégias de atuação
em rede de colaboração.
Em outra Unidade Estadual, Escola Aarão Reis, instalamos vários
computadores doados pelo Jornal O Globo, em rede física. Elaboramos um planejamento
para atuar com os alunos, mas também sofremos represálias, havendo até sabotagem
nos equipamentos. Denunciamos para Secretaria Estadual de Educação e conhecemos
pela primeira vez, o esquema dos favorecimentos e indicações políticas para
cargos, que blindava a Direção da U.E. e fortalecia os atos de violência no uso
de poder. Mais uma vez fomos forçados a sair de uma Escola.
Juraci Reis – Qual o critério de escolha da Unidade Escolar?
JR - Analisando previamente
as U.Es, os requisitos básicos para escolha da Escola Hilda Braga foram a
garantia de apoio da Gestora e professores ao projeto e o elenco de problemas
no bairro, onde a evasão escolar era grande.
Juraci – Que repercussão teve
o Projeto?
JR - O reconhecimento
oficial, traduzindo o sucesso do projeto, foi a reportagem da TV Bandeirantes
em outubro de 2000, na Escola Hilda Braga. Com a Oficina de Informática na
Escola, houve considerável redução da evasão escolar, maior interesse dos pais
em participar do ambiente e a redução da violência no entorno da Escola., pontos
que despertaram na emissora o interesse em
reportar o acontecimento.
O projeto estendeu-se para outras escolas municipais: Escola Antônio de
Freitas, Escola Maria Lopes, Escola Maria Semedo.
A APAAEP(http://www.oocities.org/br/apaaep/)
passou a fazer parte de vários
Conselhos Municipais: CMDCA, Conselho Tutelar, C.M. Saúde, C.M. Educação, numa
demonstração da confiança da Sociedade no trabalho do grupo.
Juraci – Como
anda o projeto OIE atualmente?
JR – Na escola Hilda Braga, o projeto foi
incorporado ao programa federal, com equipamentos atualizados e mais unidades,
com forte participação comunitária. Nas demais Unidades, também houve atualizações
dos equipamentos. Os espaços físicos também foram ampliados.
É bom ver belas iniciativas vindas de pais interessados na melhoria da educação. Muito se cobra do governo, dos gestores,dos professores mas a escola também é responsabilidade dos pais e da comunidade, por isso, nada os impede de contribuir para sua melhoria. Parabéns ao entrevistado pela iniciativa que com certeza servirá sempre de exemplo.
ResponderExcluirCertamente Fernanda!
ResponderExcluirA responsabilidade será sempre de todos os envolvidos direta ou indiretamente com a educação. Pena ainda serem poucos os que conseguem entender isso, permitindo maiores participações de pais! Pelo contrário, a maioria os afasta!
Juraci, que belíssima contribuição do José Reis. Ele não pensou somente na melhoria da qualidade do ambiente escolar, mas também no exercício democrático e participativo, melhorando o bem-estar de todos os envolvidos na implementação das oficinas de informática e na redução da desigualdade. Parabéns pela excelente reportagem!
ResponderExcluirÉ uma caminhada Soraya! Obrigada pelo comentário!
ExcluirEsse é um histórico de muita luta e perseverança capaz de ultrapassar a barreira do tempo... Importantíssimo que iniciativas como esta não pare de acontecer mediante as muitas dificuldades que aparecem, e elas sempre aparecem!
Beijocas!
Juraci,
ResponderExcluirParabéns pelo bela bela matéria. Sou testemunha da abenegação do José Reis, e também da sua, nesta bela obra de caridade, que certamente tem conscientizado muitos para a importância da união escola-família no processo de educação do cidadão. Acredito que a difusão deste tipo de trabalho é de extrema importância para a conscientização da sociedade, e enseja uma maior colaboração família e escola, para uma educação integral, que forje no indivíduo valores morais e intelecutais elevados, de forma que ele passe a ser uma peça fundamental na contrução de uma sociedade mais democrática e equalitária.
Tenho tido a oportunidade de participar do grupo de pais e professores na escola da Sofia, na Califórnia-EUA. Percebo que aqui nos EUA, os professores são bem empenhados na melhoria da qualidade da eduação, e estimulam a participação dos pais, embora esta ainda seja muito limitada, mostrando que o desinteresse de certos pais ocorre mesmo em países ditos "desenvolvidos". O grupo de pais e professores trabalham na mesma direção do trabalho que vocês, procurando conscientizar os pais para a importância do trabalho conjunto com a escola. O objetivo é envolver os pais, para que estes realizem trabalho voluntário na escola, em atividades complementares que enriqueçam a educação dos filhos. Torço para que estas iniciativas se multipliquem, o que paulatinamente construirá as bases de uma sociedade justa, já que a educação é a chave do progresso social.
Oi, Marcelo, obrigada pelo comentário!
ExcluirDe fato a educação é a chave do progresso social e a parceria entre escola pública inclusiva e comunidade é fundamental para qualificar as ações. Através do trabalho coletivo, escola e família que atuam como parceiros, indispensáveis no crescimento e valorização do desenvolvimento integral do aluno, percebem o fortalecimento do ensino-aprendizagem bem como o resgate dos valores, além de estreitar ainda mais os laços de compromissos com a sociedade.
Olá Juraci,
ResponderExcluirParabéns pela entrevista e pelo tema escolhido, bom saber que existem pessoas como você e o José Reis, que se preocupam e lutam por melhores condições na educação pública. É de grande importância a participação dos pais na escola, não somente em “ir” às reuniões citadas por José Reis e sim participar, ficar por dentro dos projetos que estão sendo aplicados e que serão desenvolvidos na escola, opinar, dar ideias, levar sugestões que possam implementar avanços e melhorias nas escolas e no ensino. Parabéns ao José Reis pela iniciativa.
Oi Rosana!
ExcluirObrigada por sua visita no meu blog! A iniciativa partiu de uma necessidade premente, mas o interesse em que a educação avance esse sim é incutido.
É essencial que todos nós nos preocupemos com a educação e tomemos rumo em nossas vidas no sentido de participar, pois não basta somente nos indignarmos. É preciso que haja interesse e comprometimento. Beijocas em seu coração e obrigada mais uma vez!!
Excelente abordagem Juraci. Mostra mais uma vez que a sociedade civil organizada e participativa, consegue intervir e transformar favoravelmente a escola, com ações descentralizadas, como a experiência do Sr. José Reis. Entendemos que a nossa realidade somente irá mudar, quando houver a participação de todos em favor do coletivo, na construção de uma sociedade mais justa e igual.
ResponderExcluirBom dia Rosane! Obrigada pelo comentário!
ExcluirÉ sim, a participação para que o processo educativo se transforme de tal modo, que todos da comunidade não se sintam mais com medo da escola, que atuem ativamente e tendo suas ideias respeitadas e acatadas depende de um primeiro passo: o interesse, a vontade. A partir daí tudo pode acontecer, até quando ninguém acredita como no caso acima que em detrimento de todos, a comunidade conseguiu. E olha que essa era uma época em que se falasse em computador nas escolas, as pessoas riam e chamavam de sonhadores!!!
Trabalho bacana desenvolvido pelo Sr. Reis, visto que a carência de participação das comunidades da Região da Costa do Sol na vida escolar de crianças e jovens deixa a desejar. Parabéns Juraci pela reportagem!
ResponderExcluirObrigada pelo seu post Rogéria!
ExcluirQuero dizer que essa carência de participação das famílias nas escolas, não ocorre somente nessa região, contudo a instituição que se destaca em qualquer região do país, pode averiguar, encontrará a participação ativa da comunidade escolar com parceria marcante das famílias nesse contexto. Isso é claro, com mérito da escola que proporcionou abertura à participação.
Além da figura do professor que é de suma importância para que essa parceria se efetive e permaneça.
Por fim quero expor que em toda história da educação no Brasil percebe-se que a escola que dá certo, passa muito mais pela diferença que sua comunidade escolar impetra, que pelo próprio Sistema de Educação.
Beijocas!!!
Olá Juraci e o sr. Reis, parabéns a ambos!
ResponderExcluirAo Sr. Reis:
Belíssima iniciativa do Sr. Reis por sua preocupação e empenho em proporcionar a inclusão digital aos nativos e imigrantes digitais. Reconhecidamente é uma ação que visa democratizar a educação e incluir digitalmente as comunidades distantes dos grandes centros, dando-lhes acesso a informação e, oportunizando a melhoria e qualidade de ensino e consequentemente a cidadania.
A autora do blogger:
Fazendo uma análise plástica em seu blogger, a Sra. Soube mesclar a combinação de cores, chamando a atenção para o texto, tendo a preocupação em não saturar a informação utilizando a ilustração para dar leveza e sustentação à entrevista, construindo assim, uma narrativa de forma crescente e lógica. Quando ao conteúdo abordado, é uma temática atual e louvável de ser amplamente difundida, cabendo ser dinamizada e servindo de exemplo para os docentes, discentes, dirigentes, para um fazer diferente na melhoria de ensino e da aprendizagem.
Olá Neidi, obrigada pela sua visita a esse Blog!
ExcluirQuero agradecer pelas palavras de incentivo e avaliação técnica, aliás, que chique uma avaliação técnica em meu humilde Blog, muito agradecida mesmo!
Quando recebi a incumbência de montar esse Blog, pensei a que me reportaria, sabendo que deveria estar relacionado à informática na educação. Assim resolvi depois de algum tempo de reflexão, falar sobre um trabalho que só não foi 10 por ter sido boicotado por tantas pessoas que não queriam ver a família no contexto escolar e muito menos que a educação desse certo. Todo o esforço foi válido e foram muitos e na época nem se falava de computador nas escolas que dirá colocado por iniciativa da comunidade.
A primeira intenção era a de democratizar essa ferramenta visando a melhoria da educação pública, e acabou virando um sonho sonhado por muitos corações.
Bjs e obrigada mais uma vez!