Páginas

domingo, 14 de abril de 2013

A importância de estudarmos frações na escola

Juraci Reis

Quando era criança me perguntava sempre, para quê servia algo tão chato. E de fato era! Tratado como conteúdo apenas para cumprir o currículo, o ensino de fração era na ocasião, para os alunos da minha classe, uma tortura difícil de compreender. O aluno, mecanicamente, tinha a obrigatoriedade de memorizar através dos exercícios trazidos nos parcos livros que existiam na época. Daí, eu ter criado verdadeira ojeriza!  Entretanto, aos poucos após o Curso Normal, pude perceber que fração não era de tudo inútil. Mas, somente após me lançar na carreira de docente é que fui levada a perceber o quanto era importante compreender o uso da fração em nossas vidas, embora, o mais convencional dos números racionais é a utilização dos decimais.
           Para melhor compreender a situação que vivencia o aluno no entendimento desse conteúdo, somente tendo sido aluno, principalmente em meados do século XX em que se via como ideia de medida, sem qualquer material de apoio e nenhuma aplicabilidade. E nessa concepção de fração como medida, a única que eu conseguia compreender era a metade. E não porque tenha aprendido na escola, mas sim pelas instruções que recebia da minha mãe: “parte no meio, metade para você e metade pro seu irmão”. Difícil neste contexto foi quando vieram mais dois irmãos. Os pedaços ficaram cada vez menores. Mas saber que isso era fração, isso não sabia, somente aprendendo mais tarde a significação, sem, contudo, entender para que servisse.

           Ao iniciar minha saga docência, passei por vários fracassos e isso me fazia um grande mal estar. Eu sabia que o fracasso era meu e não de meus alunos. Muitas decepções comigo mesma me acometeram e a cada vez eu entrava em parafusos e me deprimia. Buscava soluções sempre diferenciadas para que meus pequenos pudessem ter as possibilidades que não tive. 
         
           Acariciava-me o ego todas as vezes que conseguia aprender junto ao meu aluno em encontrarmos soluções para as situações propostas. Aprendi a confeccionar material e a utilizar o contexto do aluno nas aulas de fração. Facilitou muito as aulas, a decida do pedestal e o entendimento de que não detinha o saber. Juntos construímos significados para as frações que aparecem no dia a dia, transformamos em decimais com a maior facilidade e na prática medíamos, comparávamos, criávamos, explorávamos. Em verdade queria descobrir maneiras que pudesse produzir aprendizado, para enfim, que meus alunos não tivessem as mesmas dificuldades que tive com relação a Matemática, em toda minha vida. 

           Dizia sempre para mim mesma que não poderia fazer aos meus alunos o que fizeram comigo. Pois que, se ensinasse da forma como me ensinaram, eu nada estaria ensinando. Iniciei então, uma busca sem fim por estratégias diversas para houvesse de fato aprendizado na minha sala. Descobri com isso que aprendia fração à medida que adentrava na construção de processo para facilitar a apreensão desse “bicho papão” chamado fração.
           Certa vez tivemos que trabalhar porcentagem e a direção exigia que seguisse o livro didático sem a preocupação com a flexibilidade que deve existir no planejamento. Nunca antes havia aprendido, - sem vergonha de confessar-, e foi quando descobrimos que pela simplificação de fração, conseguíamos chegar ao resultado esperado, envolvendo percentagem. A cada descoberta meu entusiasmo crescia e me empolgava, contagiando os meninos que já haviam passado por frações em três anos anteriores sem assimilar qualquer coisa. Quando iniciei os estudos dos números racionais, foi uma reclamação só. Ninguém queria saber. Dessa forma, tinha que fazer a diferença, mas não sabia como. Construímos a partir de varias experimentações, com material concreto, dos quais eram manipulados e não somente observados. Situações vivenciadas em diferentes contextos dos meninos foram muito investigadas e aproveitadas. Tudo que eles me perguntavam se soubesse, não respondia, se não soubesse também não. Instigava-os a pesquisar, a pensar. Saudades dessa turma! Aprendi mais que em qualquer banco de escola onde estive! Nunca antes tinha sido tão aluna!

"Atitude responsiva ativa” e “compreensão responsiva" - AD1 de Língua Portuguesa na Educação II 2013.1


Universidade Federal Do Estado Do Rio De Janeiro
Centro de Ciências Humanas e Sociais - CCH

 

  Licenciatura em Pedagogia

LIPEAD/UNIRIO/Cederj

AVALIAÇÃO A DISTÂNCIA (AD1)

Língua Portuguesa na Educação II     2013.1
 
 
O aparecimento dos textos em uma sala de aula deve pressupor a existência de um interesse comum dos alunos aos quais a aula se dirige, um interesse comum que vai sendo produzido pelo desenvolvimento de uma aproximação diferenciada a diferentes textos, com diferentes formas de textualização, visando a diferentes situações de interlocução.
Nas três questões desta AD, vamos analisar o trabalho feito por uma professora a partir de uma atividade denominada “roda de notícias” (cf. BRAUN et AL, 2009) que, neste dia, começa com a escolha da notícia que a turma irá ler junto e cujo tema fará parte de uma séria de atividades de leitura e escrita.

ATENÇÃO: Observe a diferença entre os exercícios trazidos como proposta da professora (aos quais você NÃO irá responder) e às questões que são para você, aluna (o) do curso de Pedagogia UNIRIO.
 
PARTE 1: Em uma turma do 3º ano do ensino fundamental, a professora entrega, a cada grupo de crianças, diferentes exemplares do suplemento do jornal O GLOBO, intitulado Globinho, dizendo:
“Vocês se lembram de que já lemos antes notícias retiradas desse jornal? Quais foram ? » E as crianças vão se lembrando : « aquela sobre o teatro de Maria Clara Machado e aquela sobre a Feira do Livro e...”
 
A tarefa pedida:
Vocês vão fazer uma leitura global das matérias e reportagens dos jornais que distribuí para escolherem o texto que vamos ler por inteiro. Como já vimos, a leitura global é aquela leitura que olha os títulos, subtítulos, os diferentes tamanhos de letras, as figuras, as fotografias... Vamos estabelecer um contato inicial com o texto e pensar sobre ele, do que ele trata. Iremos fazer isso para escolher o texto que vamos ler por inteiro a fim de saber o que é importante nele, os objetivos do autor, o que ele traz.
As crianças começam a folhear os jornais que estão sobre a mesa de cada grupo e começam a ler e conversar. Pelo menos quatro grupos se detêm na página onde há várias fotos de uma índia em momentos da vida em sua tribo e onde está escrito com letras de tamanhos e cores diferentes:               
INDIAZINHA
VIRA ESTRELA DE
CINEMA
“Vamos ler esta aqui, eu vi na televisão reportagem com essa indiazinha. O filme dela é muito bom!”, diz uma das crianças para as outras de seu grupo. “Como você sabe que ela fez um filme?” Eu vi na televisão. E está escrito aqui “ indiazinha vira estrela de cinema” (lendo)
     

Questão 01 – (3,5 pontos)

Escreva um texto objetivo e claro sobre como os conceitos de “atitude responsiva ativa” e “compreensão responsiva” são ferramentas do trabalho da professora que organiza a atividade descrita acima.
 
Para escrever sobre o trabalho dessa professora lancei mão de José Manuel Moran quando em entrevista ao Portal Escola Conectada da Fundação Ayrton Senna, publicada em 01/08/2008, fala sobre a aprendizagem significativa. Nessa entrevista moram afirma:
“A escola precisa partir de onde o aluno está, das suas preocupações, necessidades, curiosidades e construir um currículo que dialogue continuamente com a vida, com o cotidiano. Uma escola centrada efetivamente no aluno e não no conteúdo; que desperte curiosidade, interesse[...]Educadores que organizem mais atividades significativas do que aulas expositivas, que sejam efetivamente mediadores mais do que informadores._
 
De tal modo, o trabalho da professora baseado na dialogicidade, favoreceu que os alunos tivessem a oportunidade de uma resposta mais ativa, conectada nas situações de ensino e aprendizagem com significado. Assim, a docente estabeleceu vínculos de aprendizagem contextualizados possibilitando ao aluno um conhecimento funcional e colaborativo.
Moran ainda reflexionando sobre a forma como a escola deve atuar leva-nos ao pensamento crítico ao alegar que
“A escola precisa cada vez mais incorporar o humano, a afetividade, a ética, mas também as tecnologias de pesquisa e comunicação em tempo real. [...]
 
Dessa forma vimos nas atividades propostas pela professora uma atitude responsiva com relação a seus alunos que imediatamente responderam as expectativas prenunciadas. A sua prática beneficiou a compreensão responsiva ativa, permitindo com muito mais significado, que o aprendizado se instalasse.
Com relação a responsividade, BAKHTIN (1998) afirma que toda compreensão quando concreta, é ativa, avaliando como uma abstração a compreensão passiva. Bakhtin nos alerta para o entendimento de que tanto a compreensão quanto a resposta não estão dissociadas, elas se fundem na dialeticidade, ou seja, uma não existe sem a outra.
Essa prática fez com que o ensino fosse além da proposta estagnada que prevê uma educação voltada para memorização e repetição de conteúdos. Vimos então, nesse trabalho, que a compreensão responsiva ativa iniciou-se com a compreensão para advir à atitude responsiva, através da interação verbal e não verbal. De forma significativa, a professora incluiu temas do interesse dos alunos.
 
 
PARTE 2: Depois de muito debaterem, as crianças escolhem ler por inteiro a notícia sobre o lançamento do filme “Tainá – A origem”, publicada no suplemento do dia 02 de fevereiro de 2013, transcrita a seguir:
Nascida no Pará, a menina Wiranu Tembé vive a personagem principal de “Tainá – a origem”, que estreia sexta-feira.
Marina Cohen

  A indiazinha mais famosa do Brasil está de volta! Depois de dois filmes que mostraram as aventuras da garotinha nascida numa aldeia da Floresta Amazônica, o longa-metragem “Tainá – A origem”, que estreia na sexta-feira, contará como começou a história dessa pequena guerreira. Na nova jornada, a menina órfã precisa descobrir quem é sua mãe e também ajudar sua tribo a enfrentar o inimigo Jurupari, que quer destruir a floresta. Mas a personagem não está sozinha. Sua amiga Laurinha, vinda da cidade grande, e o índio Gobi, um verdadeiro nerd, serão seus companheiros.
– Por que uma menina não pode ser guerreira? E por que um menino indígena não pode ter um laptop? Além de mostrar as peripécias desse trio diferente, o filme também questiona esses padrões – explica a diretora, Rosane Svartman.  – Esse também é um jeito de as crianças conhecerem melhor os povos da floresta e a Amazônia, uma região linda que fica no Norte do nosso país.
Esse é o terceiro longa da série “Tainá”. O primeiro foi lançado em 2000 e o segundo , em 2004, sempre com índias de verdade interpretando a personagem principal. O novo filme mantém a tradição. Assim como Tainá, a menina Wiranu També, de 8 anos, adora subir em árvores, andar de canoa, brincar com macacos e de arco e flecha.
Wiranu foi descoberta pela equipe de produção na aldeia Tekohaw, no Pará, quando tinha 5 anos. Cerca de 2.200 meninas fizeram o teste para interpretar Tainá, mas o preparador de elenco Cláudio Barros se impressionou com a esperteza de Wiranu logo que a conheceu. Ela não falava português, mas aprendeu muito rápido. Para a indiazinha, a parte mais divertida da filmagem foi andar de balão – sim., tem um balão todo colorido no filme!
 – Adorei passear de balão. Também me diverti muito com a música que a gente canta no filme para espantar o medo – lembra Wiranu, se referindo à canção folclórica “Toque Patoque”, que é tema do longa-metragem.
A menina garante que não teve medo de nada, nem de contracenar com filhotes de onça, com macacos e araras. Pelo contrário, Wiranu adora bichos.
– Tainá não tem medo de nada. Nem eu! – avisa ela.
Mas nem tudo é trabalho. Nos intervalos das gravações, Wiranu, a lourinha Beatriz Noskoski (que interpreta Laurinha) e Igor Ozzy (o Gobi) se divertiam na floresta.
– Adorávamos tomar banho de rio no fim do dia, depois das filmagens, e brincar no meio das árvores – conta Bia, que, como muitas crianças da cidade grande, nunca havia entrado em uma floresta.

Antes da leitura por inteiro da notícia, a professora escreveu no quadro:
A notícia é sobre o lançamento de um filme. Será que nela encontraremos:

1)    um resumo da história do filme?

2)    as características das personagens do filme?

3)    informações sobre a indiazinha Wiranu Tembé que virou estrela de cinema?

4)    palavras específicas da área do cinema? Quais?

5)    Palavras com as letras “w”, “k”? Quais? Por quê?

 

Questão 02 – (3,5 pontos)


De que modo as perguntas colocadas pela professora podem ser descritas em termos do trabalho com diferentes níveis de conhecimento prévio da criança? Explique.

 

A professora ofertou aos alunos subsídios para que eles mesmos encontrassem caminhos para compreender e interpretar o texto, respeitando o conhecimento de mundo que cada um traz, previamente, antes mesmo de saber ler palavras. Ao invés de perguntas vazias tão em voga nas interpretações de textos nas escolas, a professora, de maneira inteligente, instigou seus alunos vontade, na busca de  solucionar os questionamentos, pelo prazer de saber.

Dessa forma, a educadora, proporcionou autonomia aos pequenos leitores, instigando a curiosidade tão presente nos meninos, muitas vezes destruída por práticas pedagógicas arcaicas. A leitura de mundo pertencente a cada ser, portanto intrínseca, nada existe de homogêneo nessa interpretação, visto que a cada pessoa uma visão diferente de um mundo próprio e intransferível. Embora, ouvir o outro e o sentido que a leitura teve para cada um, discutir argumentos a fim e respeitar os componentes exigidos pelo texto, deva fazer parte dessa prática.

Sendo a leitura uma prática social para melhor entender o mundo, a professora organizou o trabalho para que os alunos tivessem oportunidade de ativar seus conhecimentos e assim atribuir significados as questões. Além de utilizar os conhecimentos de que o aluno dispõe, fez o tipo de pergunta que induz ao aprendizado daquilo que ele ainda não sabe.

 

PARTE 3: Em outro dia de aula, a pedido das crianças, a professora apresentou a canção “Toque Patoque” citada na notícia. Primeiro ela apresentou uma versão com regência de Ederson Teixeira e Ana Carolina Marques, a fim de mostrá-la como existente antes do filme, já que faz parte do folclore de Recife, Pernambuco. Assista em http://www.youtube.com/watch?v=9nJCe0F6Xl8

Depois ela apresentou um vídeo promocional do filme “Tainá – A origem” no qual as personagens infantis cantam e dançam a canção. Assista em:     http://www.youtube.com/watch?v=--1P7YvcFQk

No quadro colocou:

Toque Patoque

 

Toque patoque
Patoque toque
tiquetê tiquetê
tumba tumba tumba tumba

Depois de brincarem com a letra e com a música, a professora pediu às crianças que pegassem os cadernos e escrevessem uma carta para a redação do jornal Globinho pedindo a eles que lhes informassem sobre a língua e o significado da letra da canção. Antes, porém, conversaram sobre as condições de produção de uma carta.

Questão 03 – (3,0 pontos)


Explique a atividade proposta pela professora com base na noção de “escrita como atividade produtora de sentido”. 

Perguntado como favorecer a aprendizagem significativa no contexto escolar, Moran na mesma entrevista descrita acima responde o seguinte:

[...] Partindo de situações concretas, de histórias, casos, vídeos, jogos, pesquisas, práticas e ir incorporando informações, reflexões, teoria a partir do concreto. Quanto menor é o aluno, mais práticas precisam ser as situações para que ele as perceba como importantes para ele. Não podemos dar tudo pronto no processo de ensino e aprendizagem. Aprender exige envolver-se, pesquisar, ir atrás, produzir novas sínteses fruto de descobertas.

Os conteúdos precisam ter uma utilidade para despertar nos alunos a vontade de aprendê-los, além do que, deve aproximar-se do aluno e de suas vivências, expressivamente. Para tanto é imprescindível que as atividades de escrita para ser uma atividade produtora de sentido, tenham como produto fim, o leitor. Afinal, escreve-se para quê, se não for para ter seu texto lido?

Dessa forma, a professora deu sentido à escrita de seus alunos tornando-a funcional e com significado. Ao partir de situações concretas e lúdicas como pronunciou Moran, os alunos foram levados ao conhecimento acadêmico de maneira prazerosa, com envolvimento, sem serem passivos e estanques. Ao final ainda terão a possibilidade de ampliar seus conhecimentos sem com isso tê-lo recebido pronto, aprisionado dentro de um currículo já ultrapassado. Esta metodologia, proposta de um trabalho inovador, imprime significado ao ato de aprender, pois leitura e escrita foram carregadas de sentidos, capazes de promover transformações, objetivando letrar, muito além de que ensinar a ler e escrever.


Fonte:



ZOZZOLI, Rita Maria Diniz - A noção de compreensão responsiva ativa no ensino e na aprendizagem

MORAN, José Manuel - Aprendizagem significativa

 

Temple Gradin

Temple Grandin fala em entrevista exclusiva para a Revista Autismo PDF Imprimir E-mail
Edições - Edição 3
Escrito por Carolina Rafols, dos EUA   
Sex, 21 de Dezembro de 2012 12:01
Share
Por Carolina Rafols,
dos Estados Unidos
TempleGrandin4

Revisão da tradução para o português:
Wilson Langeani Filho


Temple Grandin é uma fonte de inspiração para inúmeras famílias e profissionais ao redor do mundo. Atualmente ela é a mais bem sucedida e célebre profissional norte-americana com autismo, altamente respeitada no segmento de manejo pecuário. A dra. Grandin se tornou uma proeminente autora e palestrante sobre o tema autismo porque ela é uma prova viva de que as características de autismo podem ser modificadas e controladas (in Emergence: Labeled Autistic).
Bacharel pelo Franklin Pierce College e com mestrado em Ciência Animal na Universidade Estadual do Arizona, é Ph.D. em Ciência Animal, desde 1989, pela Universidade de Illinois. Hoje ministra cursos na Universidade Estadual do Colorado sobre comportamento de rebanhos e projetos de instalação, além de  prestar consultoria para a industria pecuária em manejo, instalações e cuidado de animais. Já apareceu em diversos programas de televisão [dos Estados Unidos], como 20/20, 48 Hours, CNN Larry King Live, PrimeTime Live, Today Show, e muitos outros em diversos países, também já foi destaque em publicações como a revista People, New York Times, Forbes, U.S. News and World Report, revista Time, o New York Times Book Review e a revista Discover. Em 2010 foi nomeada pela revista Time como uma das 100 pessoas mais influentes. A Rádio Nacional dos Estados Unidos transmitiu entrevistas com a dra. Grandin. Ela já escreveu mais de 400 artigos publicados em revistas científicas e periódicos especializados, tantando de manejo de rebanho, instalações e cuidados dos animais. É autora dos livros: Thinking in Pictures, Livestock Handling and Transport, Genetics and the Behavior of Domestic Animals e Humane Livestock Handling. Seus livros Animals in Translation (lançado no Brasil com o título "Na Língua dos Bichos") e Animals Make Us Human (no Brasil: "O Bem-Estar dos Animais") estão na lista dos best sellers do New York Times, sendo que este último também consta na lista dos best sellers do Canadá. Entre os livros da dra. Grandin que tratam do tema autismo, o mais vendido atualmente é  The Way I See It: A personal Look at Autism and Asperger's, também são de sua autoria Unwritten Rules of Social Relantionships e Emergence: Labeled Autistic — [também escreveu uma auto-biografia, lançada no Brasil em 2009 com o título: "Uma Menina Estranha"] (veja seus livros no site em inglês).
A história de sua vida virou também um filme da HBO, Temple Grandin, estrelando Claire Danes. O filme mostra sua vida durante a adolescência e o  inicio da sua carreira.
Em abril, Temple Grandin lançou um novo livro "Different...not Less." Inspirador e informativo, o livro fala sobre formas de melhorar a vida das pessoas com autismo, síndrome de Asperger, e TDAH (Transtorno de Deficit de Atenção e Hiperatividade). Ele segue a vida de adultos, muitos diagnosticados tardiamente, e explica como eles se conheceram, seus desafios e tornaram-se pessoas de sucesso!
Segue a entrevista exclusiva para a Revista Autismo, em que Temple Grandin responde a perguntas sobre a importância da intervenção precoce, bons mentores, agressão, e muito mais.

TempleGrandin1REVISTA AUTISMO: Em muitas entrevistas você menciona a importância de "bons mentores" e "desenvolver os pontos fortes das crianças". Você pode esclarecer essas duas idéias?
Temple Grandin: Na escola era motivo constante de chacota e vivia  triste. O único refúgio longe das provocações eram atividades práticas como passeios a cavalo e o laboratório de eletrônica. As crianças que gostavam dessas atividades não me importunavam. Essas atividades eram os refúgios das provocações. Mamãe foi capaz de me ensinar a cumprir horários e ter boas maneiras, mas ela não foi capaz de me obrigar a estudar. Não me senti motivada a estudar até ter uma razão para isso. Quando estava na escola eu não via sentido em estudar. Existiam certos tópicos em que ganhava nota máxima, como em biologia; e outros assuntos como inglês e história nos quais eu não tinha interesse.
Meu professor de ciências, sr. Carlock, foi peça-chave em me motivar a estudar. Depois de retornar da fazenda dos meus tios, fiquei fascinada pelo tronco de gado. O tronco é um mecanismo para conter e imobilizar os animais para vacinação. Consiste num compartimento de metal com painéis que comprimem o animal de ambos os lados do corpo. Ao observar o gado passando pelo tronco, notei que, algumas vezes, os animais relaxavam quando a pressão dos painéis laterais era aplicada sobre seus corpos.
Sofrendo constantes ataques de pânico, resolvi experimentar o aparelho de pressão. Descobri que a compressão aplicada pelo tronco aliviava minha ansiedade e o meu nervosismo. Infelizmente, muitos dos meus terapeutas e médicos consideraram estranho usar um tronco de gado. Depois que construí um aparelho de pressão semelhante ao tronco para me acalmar todos quiseram tirá-lo de mim. Imediatamente me fixei nisso  e fiquei motivada a provar que o efeito relaxante era real.
O  sr. Carlock viu nisso uma oportunidade para me motivar ao estudo. Ele me falou  que era para descobrir por que a pressão tinha um efeito relaxante, então eu tinha que estudar ciências. No meu último ano de escola eu rapidamente melhorei minhas notas baixas em inglês e história pois vi que devia passar nessas matérias se quisesse ir para a faculdade e tornar-me uma cientista. O sr. Carlock direcionou a tremenda aptidão autista da fixação e usou isto para motivar um estudo acadêmico.
Nunca esquecerei a ida à biblioteca acadêmica com o sr. Carlock. Nessa ocasião eu aprendi que os verdadeiros cientistas lêem artigos periódicos publicados em revistas científicas. Eu não sabia o que era uma revista científica. No começo dos anos 60, acompanhar revistas científicas era difícil. As revistas de psicologia eram indexadas em grandes livros contendo o resumo dos artigos. Como as copiadoras não estavam disponíveis, cada resumo que você quisesse arquivar tinha que ser copiado à mão num cartão index, e eu tinha todos os cartões guardados numa caixa de arquivo. Para o final dos anos 60, quando as copiadoras se tornaram prontamente disponíveis, fiquei em êxtase quando pude copiar artigos inteiros, que eu ordenava cuidadosamente em pastas de arquivo de folha soltas. A carreira científica acadêmica é difícl, mas a minha tendência autista em fixação [num assunto] me mantinha firme. Meu exemplo mostra claramente como um professor criativo pode realmente transformar a vida de um aluno.
Adquirir habilidades úteis que possam reverter numa carreira requer o direcionamento de um professor. Hoje tenho observado que os indivíduos que seguem carreiras de sucesso, como programação de computador, tiveram um mentor para ensiná-los. Requer disciplina adquirir uma habilidade. Em áreas técnicas, eu observei que são raras as crianças que vão aprender por conta própria a fazer programações complexas de computador. Quando entregues aos seus próprios equipamentos, elas tendem a se viciar em vídeo games e subutilizam os computadores. Elas precisam de atribuições e orientação de um bom professor para aprender habilidades profissionais relevantes. Em algumas famílias, o pais fazem dos filhos aprendizes em suas próprias profissões. Isso tem funcionado para muitas crianças no espectro [do autismo].

REVISTA AUTISMO: Você pode falar sobre a importância do diagnóstico precoce no sistema público de saúde? E intervenção precoce no sistema público de saúde?
Temple Grandin: Crianças pequenas de dois a cinco anos de idade sem fala ou comportamentos repetitivos devem ter 20 ou mais horas por semana de instrução individual com um professor que lhes ensine palavras, ensine "turn-taking" [numa tradução livre, significa "esperar a vez", auto-controle, ter atenção no outro para saber quando iniciar sua ação], e como engajar-se e manter-se em atividades. O ensino educacional precoce vai ajudar a criança a desenvolver-se a estágios superiores.

REVISTA AUTISMO: Qual é o seu conselho aos pais de jovens adultos na porção inferior do espectro que não obtiveram intervenção precoce por bons mentores?
Temple Grandin: Muitos indíviduos de baixa funcionalidade apresentam severa desorganização sensorial. Eles podem não ser capazes de tolerar um restaurante ou loja barulhentos. Alguns indivíduos são sensíveis ao som e outros conseguem ver a intermitência de luzes florescentes. Hiper estimulação causa dor e isto pode levar a crises.

REVISTA AUTISMO: Qual é o seu conselho para os pais ajudarem  seus filhos adolescentes situados no meio do espectro durante a transição para a idade adulta?
Temple Grandin: Todos os indivíduos com autismo, na parte superior, inferior e no meio do espectro precisam adquirir habilidades profissionais. Os adolescentes enquanto ainda estão na escola devem realizar atividades como, por exemplo, vender jornal, cuidar do lixo, ou jardinagem. Indivíduos na porção superior do espectro devem começar a trabalhar em algo que se encaixe na sua área de aptidões, como arte, fotografia, design gráfico, programação de computadores, jornalismo, mecânica de automóveis, ou vendas no varejo.

REVISTA AUTISMO: O que devem ter em mente os professores e profissionais quando tratam crianças de dois a oito anos de idade?
TempleGrandin3
Temple Grandin: Crianças com idade entre dois e oito anos precisam de muita instrução individual. Desenvolver os pontos forte da criança. Se ela gosta de arte, encoraje o desenho e pintura. Se ela gosta de matemática ou escrever, você deve encorajar isso. Se a criança gosta de aviões ou trens, use isso para ensinar leitura e matemática. A área de aptidão da criança normalmente surge na idade de sete a nove anos.

REVISTA AUTISMO: Como o sistema de ensino pode apoiar melhor os alunos de ensino médio que estão na porção superior do espectro?
Temple Grandin: Estudantes do ensino médio na extremidade superior do espectro precisam adquirir habilidades profissionais antes de sair da escola. Algumas das pessoas mais inteligentes do mundo tem autismo. Alguns exemplos são Steve Jobs, da Apple, Einstein e Mozart. Crianças que são boas em matemática podem aprender programação de computador, física ou estatística. Os alunos precisam aprender a desempenhar tarefas que os outros precisam. Desenvolver habillidades inatas na arte, matemática, literatura ou música.

REVISTA AUTISMO: Qual é sua reflexão sobre a importância de uma conscientização em relação ao autismo ao redor do mundo?
Temple Grandin: É importante que as pessoas estejam conscientes sobre o autismo.

REVISTA AUTISMO: Como pais e profissionais podem lidar da melhor maneira com comportamento agressivo em adultos com autismo?
Temple Grandin: É crucial considerar fatores biológicos contra fatores comportamentais. Fatores biológicos podem incluir questões sensoriais ou dolorosos problemas de saúde não revelados, como refluxos ácidos e dores de dente. Ao considerar fatores comportamentais, pais e profissionais devem procurar o que está causando tal comportamento: se é para chamar atenção, rejeição de tarefas/fuga, ou comportamentos auto-estimulantes.
Quando me tornava agressiva, a TV me era tirada por um dia. Também aprendi a controlar a agressão trocando a raiva pelo choro. Provocações, bullying e xingamentos me fizeram infeliz quando eu estava na escola.

TempleGrandin2REVISTA AUTISMO: Você é uma inspiração para inúmeras famílias brasileiras. Que mensagem você daria para as famílias que ainda estão sofrendo com a falta de tratamento e intervenção precoce, devido à ausência de políticas que protegem as pessoas com autismo em nosso país?
Temple Grandin: Esta é uma questão difícil de responder. Para contribuir com a inclusão, precisamos mostrar o que pessoas com autismo são realmente boas em fazer. Uma habilidade é a memória incrível. Muitos indivíduos do espectro autista seriam bons em lojas do varejo ou em armazéns, porque eles podem se lembrar e ter informações de todos os produtos. Em uma cidade, um homem autista memorizou a posição de toda a tubulação sob as ruas. Ele poderia mostrar as equipes de construção o local correto para escavar para evitar quebrar os canos.

REVISTA AUTISMO: Para encerrar, como as pessoas com autismo estão contribuindo para um mundo melhor?
Temple Grandin: As pessoas com autismo contribuem para um mundo melhor porque pessoas na porção superior do espectro do autismo inventaram muito em tecnologia e nas artes. Eu estimo que metade das pessoas na indústria de computadores tem autismo moderado. Eles são menos sociáveis, mas ganham na habilidade do pensamento. O autismo é um traço contínuo que varia entre Einstein e baixa funcionalidade, a genética é um fator preponderante na causa do autismo.
 
CarolinaRafolsCarolina Rafols é mãe da Kayumi, além de ser terapeuta comportamental, mestre em Educaçao com especializaçåo em Análise Aplicada do Comportamento pela National University e graduada em Psicologia pela Cal State Northridge University (ambas nos EUA). Desde de 2004, trabalha com crianças e adolescents com autismo na Califórnia, EUA. Tem interesse em Pivotal Response Training (PRT) e treinamento de pais e måes durante terapia individual in-home. Voluntária na luta pelos direitos das pessoas com autismo no Brasil e nos Estados Unidos.
 
Retirado na íntegra do site Revista Autismo, hoje dia da Coscientização do Autismo.
 
http://www.revistaautismo.com.br/edic-o-3/temple-grandin-fala-em-entrevista-exclusiva-para-a-revista-autismo